9.8.11

Miserável



Para Manuelito,
pela loucura que o persegue sem fim

Manuelito!


Passa fome e passa frio. Não tem vizinho. Vive só. Sem tom nem voz. Ao relento – nas esquinas do Patrice – como esqueleto. Quando quer é alegre, mas sempre se entristece. Geme de frio lambido pela fome. Anda. Fala. Mas não sente, nem ouve. Apenas vê. E só vê o que vê. Vê o que quer. Brinca com quem quiser, mas ninguém é seu amigo. Todos o conhecem, mas ele, a ninguém reconhece. Ás vezes canta, mas não entoa hino nenhum.

Manuelito é ninho sem passarinho. Caminho sem gente. Ngalanga¹ sem dança, terra sem nação. Vive sem noção.

Manuelito não tem razão. Vive sem protecção. Mas é gente. Sofre com o que não sente. Chora por quem não conhece. Seu dia não amanhece. Todos o conhecem, mas a ele, ninguém reconhece. Por isso que enlouquece.

Manuelito é louco no meu bairro e lúcido em qualquer lugar!



1. Ngalanga – tipo de ritmo e dança tradicionais.

3.8.11

O Morto


Para minha avó,
esposa segunda do meu pai,
 mãe de dois irmãos meus
e falecida

Um bando de dor se excitou,
Lágrimas em versão dos hinos celestes,
Buscavam o momento do adeus último.

Diante de mim, estava a nova habitante do além
Do poente
Do fim
 Da noite que não amanhece.

De doloroso
Nascia no escancaro,
A tumba
O túnel do abrigo na morte.
Mais uma vida se rendera aos deuses assassinos
Desta vez
Foi em Junho.

Aos meus olhos
A pirâmide esquivou-se do mortífero Setembro…
Quem sobrou….
Quem sobrou?
O que ficou?

… A maldita que engolirá a minha mãe?
A peste que cobiça o meu pai?
O próximo é desconhecido
Mas existe
E a peste o levará para onde quiser